Por: Renato Carbonari Ibelli
A imensa maioria das empresas brasileiras, 90% delas, tem perfil familiar, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE). Ou seja, parentes compõe a administração e diretoria dessas companhias. O problema é que perfil empreendedor não é característica genética.
São poucas as empresas familiares que resistem à sucessão. Segundo estudo de 2018 da PwC, no Brasil, apenas 30% têm êxito ao passar da primeira para a segunda geração. Quando a terceira geração entra em cena, a taxa de sucesso é ainda menor, de apenas 5%.
A falta de planejamento sucessório leva a essas estatísticas negativas. Segundo Armando Lourenzo, professor da FIA e autor de livros sobre esse tema, sucessão depende do comprometimento de fundadores e herdeiros com a profissionalização, alinhamento estratégico e estruturação de processos.
Para o especialista, se as empresas familiares se atentassem a esses pontos, a taxa de sucesso da transição da primeira para a segunda geração subiria de 30% para perto dos 70%. “Não é possível chegar aos 100% porque há fatores comportamentais envolvidos”, disse Lourenzo em palestra, na última-sexta-feira (7), no Conselho de Serviços da Associação Comercial de São Paulo (ACSP).
Por exemplo, é natural, segundo o especialista, que o fundador da empresa seja centralizador. Normalmente empresas familiares nascem pequenas e crescem porque o dono viveu em função do negócio. Abrir mão de controle, olhando por esse ângulo, realmente é complicado.
“O problema é que, quanto mais centralizador, menos se desenvolve as pessoas que estão abaixo na hierarquia, e isso dificulta a profissionalização da empresa e, consequentemente, a sucessão”, diz Lourenzo.
Outro ponto que costuma derrubar a longevidade das empresas familiares é a falta de separação entre o que é empresa e o que é família. O caixa da companhia não pode ser “saqueado” para manter gastos pessoais de seus administradores.
Mas essa é uma questão que vai além das finanças. “É complicado demitir um filho, por exemplo. O ideal seria separar totalmente família da empresa, mas na prática sabemos que é difícil, e muitas vezes o que resta é contornar a situação”, diz o especialista.
Algo que ajuda a reduzir problemas com situações como a descrita acima é ter processos gerenciais bem estruturados, com análise de desempenho da equipe, com critérios objetivos para remunerar e promover.
Usar critérios técnicos e objetivos também ajuda a estimular funcionários que não fazem parte da família do dono da empresa, criando a sensação de competição justa por salários e cargos.
Lourenzo lembra que o sucessor vai herdar também a equipe escolhida pelo fundador da empresa, e o nível de relacionamento pode não ser o mesmo. Mais uma vez, serão os processos gerenciais bem construídos que garantirão a transição menos traumática.
Esse ponto leva a outro ainda mais importante para um processo de sucessão bem executado: a profissionalização do sucessor. Aqui, Lourenzo usa como referência o critério 70-20-10, que dá peso aos diferentes fatores que influenciam um bom desenvolvimento profissional.
Segundo esse critério, 10% dependem de uma boa formação educacional, 20% da interação com pessoas mais experientes e 70% dos desafios e experiências vivenciadas. “Claro que esses percentuais variam, mas o que vale são os pilares. O mais importante nesse ponto é que nenhuma empresa familiar sobrevive ao despreparo dos sócios”, diz.
O especialista lembra ainda que sucessão é um processo, não uma mudança repentina. Há mais do que questões patrimoniais envolvidas. “É preciso trabalhar a saída gradual dos fundadores, pois geralmente são pessoas que viveram a empresa por décadas, e que podem passar experiências no dia a dia durante essa transição”, lembra Lourenzo.
Por fim, é importante considerar a sucessão como uma alternativa, e não a única alternativa. A empresa pode ser vendida ou ter um administrador externo. A escolha passa necessariamente pela disposição e preparo dos sucessores.
Fonte: Diário do Comércio