Algumas empresas já estão voltando para a rotina dos escritórios. Outras, porém, irão manter o teletrabalho durante um tempo maior. Há, inclusive, quem pense em manter o trabalho em casa mesmo pós-pandemia, pela diminuição de custos de manutenção e o ganho de tempo, devido a evitar o trânsito intenso das grandes cidades.
Contudo, a transição da rotina de trabalho de muitos para o ambiente virtual tem trazido repercussões muito além de crianças interrompendo reuniões. Ao redor do mundo, as relações de trabalho e o bem-estar de colaboradores vêm sofrendo novos desafios.
É correto monitorar o colaborador?
Uma matéria da NPR, rede de rádio pública dos Estados Unidos, conta que empregadores tem obrigado seus funcionários a instalar, em seus computadores, software que monitora não somente os sites visitados, mas também todos os movimentos de mouse e teclas pressionadas. Algumas empresas exigem que colaboradores apareçam, via webcam, durante todo o horário de trabalho; outras determinam a instalação de aplicativo de geolocalização no celular, a fim de registrar onde se encontram a todo momento.
Monitorar o computador da empresa já era prática consagrada, e legalmente permitida na maioria das jurisdições, onde a lei entende que o funcionário está fazendo uso de equipamento de propriedade do empregador, e, portanto, deve se sujeitar às suas regras. Mas as novas exigências de monitoramento têm causado entre profissionais a sensação de terem sua privacidade invadida, pois agora estão sendo “vigiados” dentro de suas casas.
A justificativa utilizada, em alguns casos, é de que o monitoramento contribuiria para uma melhor performance e efetividade do time. Há casos, inclusive, de trabalhadores que recebem um aviso na tela após alguns minutos sem atividade (quando foram ao banheiro, por exemplo), indicando que seu tempo pode ser descontado caso não retornem logo. Sem entrar nos aspectos jurídicos dessa nova prática – que podem variar significativamente, dependendo do local onde empresa e funcionário estejam – os efeitos observados revelam muito sobre cultura organizacional, liderança e employee experience.
Quando um profissional é contratado, presume-se que tenha demonstrado não só as qualificações e competência para realizar determinada função, mas também um nível de integridade indicativo de que exercerá tal função honestamente, e com o comprometimento de que a empresa necessita. Inicia-se, portanto, uma relação de confiança mútua, e que deve ser mantida quando a distância física se impõe. Líderes que não confiam em seus liderados deve se perguntar: “estou exagerando e virando um micro manager? ou tenho razões para desconfiar desse colaborador?” – neste último caso, devem indagar por que contrataram alguém em quem não podiam confiar. Ou pensar em substitui-lo.
O que gestores podem fazer para assegurar a produtividade quando não estão lado a lado com sua equipe?
Bons líderes têm adotado uma rotina de comunicação constante com suas equipes, para demonstrar apoio, entender a situação particular de cada um frente à pandemia, e deixar claro quais são suas expectativas e metas de produtividade neste momento. É essencial para o sucesso de qualquer missão que integrantes do time sintam que são ouvidos e serão auxiliados caso encontrem dificuldade em produzir, e que serão sempre reconhecidos por seu esforço e engajamento.
É certo que a supervisão e orientação (provavelmente mais fáceis de exercer presencialmente) devem continuar no ambiente virtual, mas invadir a casa e rotina doméstica de cada um causa insegurança e afeta o moral do staff e a autoestima individual.
Soluções mais inteligentes e respeitosas para manter a eficiência e uma dinâmica colaborativa são:
· Estabelecer metas e deliverables com objetividade;
· Definir papeis claros para cada membro do time;
· Implementar processos de checagem periódica do atingimento de cada objetivo;
· Marcar encontros virtuais um a um, mas também deixar a “porta” aberta para conversas espontâneas;
· Incentivar o compartilhamento de informações entre colegas através de plataformas de colaboração;
· Para descontrair e fortalecer as relações interpessoais, criar eventos como um almoço ou happy hour virtual, focados em assuntos não ligados aos projetos em andamento.
Em vários segmentos, o período de avaliações de desempenho deve iniciar nos próximos dois meses. Essa será a melhor oportunidade para medir o comprometimento e atuação de cada membro do time. Desafios pessoais, como familiares doentes ou exigências extremas de cuidado em casa, devem ser levados em consideração na avaliação. Por outro lado, entre os que operaram em condições equivalentes, o que cada um produziu pode revelar muito sobre como encarou o período de teletrabalho. Mas um líder competente não aguarda essa oportunidade para oferecer feedback: conversas rotineiras, checkpoints claramente estabelecidos para acompanhar o andamento de projetos, observação atenta e interesse genuíno pela situação cada liderado ajudará a garantir um desempenho honesto e efetivo.
No âmbito organizacional, empresas estão dispendendo tempo e recursos materiais significativos para realizar uma atividade não-produtiva – o monitoramento de seus times. Esses recursos poderiam ser alocados de maneira a melhorar o desempenho e enriquecer a experiência do colaborador: investir em programas de treinamento, oportunidades de promoção e incentivos financeiros terão mais atratividade do que qualquer ameaça de punição.
Fonte: Administradores