A crise gerada pela pandemia do coronavírus forçou milhões de pessoas a recorrerem às compras pela internet. O que resultou em uma alta superior a 30% das vendas desde março, diz a associação do setor, a Abcomm. No entanto, esse crescimento veio acompanhado de um aumento de 10% no número de produtos falsificados e irregulares apreendidos pela Receita Federal no primeiro trimestre deste ano, em comparação ao mesmo período de 2019.
É de olho nesse cenário que a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, decidiu dar o pontapé inicial para a criação de um código de autorregulamentação, elaborado em parceria com o setor, para coibir a pirataria no comércio eletrônico.
Segundo especialistas, os produtos irregulares vêm ganhando espaço dentro dos chamados marketplaces – grandes plataformas de e-commerce que abrem espaço para diferentes empresas venderem por meio do seu site. Segundo Luciano Timm, secretário nacional do Consumidor, a autorregulamentação facilitará para os consumidores a identificação da companhia da qual estão comprando dentro do marketplace. Para isso, será obrigatório informar dados como CNPJ, telefone e endereço.
– A ideia é criar um controle desses vendedores. Isso vai permitir criar uma lista de infratores, impedindo que essas empresas irregulares migrem de um site para outro. Desde o início da pandemia, as compras aumentaram muito pela internet, o que potencializou o problema das falsificações. É preciso ter um comprometimento mínimo das plataformas – ressalta Timm.
A expectativa é que, até o fim de junho, os sites de e-commerce que aderirem ao projeto de autorregulamentação ganhem um “selo” para indicar ao consumidor que os produtos vendidos nessas plataformas estão em conformidade com regras de propriedade intelectual e garantam a segurança do consumidor.
– É preciso que as plataformas tenham cuidado ao vender qualquer tipo de bem. Já pegamos empresa que vendia produtos sem nota fiscal e sem contrato social. A pandemia acelerou nossos esforços nesse sentido – destaca o secretário.
A iniciativa pode ajudar consumidores como a aposentada Maria Couto, que precisou comprar um novo celular durante a pandemia e quase caiu em uma armadilha. Após uma pesquisa na internet, ela se deparou com preços muito abaixo da média em um site que vende produtos novos e usados. Desconfiada, Maria pesquisou nos comentários e ficou surpresa ao ver que consumidores estavam reclamando da falta de nota fiscal.
– Vi gente falando ainda que o manual veio em mandarim porque era da China. Isso é muito ruim, pois, em caso de defeito, onde eu iria reclamar? – reclama Maria, que desistiu da compra.
Segundo Edson Vismona, presidente do Fórum Nacional contra a Pirataria (FNCP) e do Instituto Brasil Legal, a iniciativa é extremamente importante, pois a internet é o destino principal da maior parte dos produtos que escapam das operações de apreensão do governo federal, como as realizadas nas fronteiras.
– O consumidor muitas vezes compra produtos sem saber que podem ser ilegais. A internet virou um espaço tranquilo para as quadrilhas. E neste momento de crescimento do comércio eletrônico, os ilegais aproveitam para crescer, prejudicando o consumidor. É importante ter o selo, para que o cidadão consiga diferenciar quais e-commerces protegem seus clientes. Muitos estão preocupados apenas com a margem de lucro – alerta Vismona.
A iniciativa é boa também para a economia do país. Segundo dados do Fórum Nacional contra a Pirataria, a venda de itens falsificados e contrabandeados gerou uma perda econômica de cerca de R$ 291 bilhões somente em 2019, valor que deixou de ser arrecadado com impostos e vendas no comércio legal. Em geral, as infrações mais frequentes ocorrem na venda de itens como celulares, vestuário, produtos de higiene. Com a pandemia, as máscaras entraram nesse rol.
– A lógica do mercado ilegal é ocupar espaços oferecendo produtos com preços mais baixos, não pagando impostos. Com a brutal recessão, o poder aquisitivo ficará prejudicado, e produtos mais baratos acabam atraindo o consumidor – diz Vismona.
A autorregulamentação vai se somar a uma nota técnica, editada no fim de 2019, que determina que a comercialização de produtos ilegais e falsificados é de responsabilidade das plataformas de comércio eletrônico. Em março, o decreto 10.271 já tornou obrigatório os sites listarem 12 informações básicas sobre os vendedores abrigados em suas plataformas. Entre os dados obrigatórios estão nome comercial e social da empresa, endereço físico e eletrônico, CNPJ, identificação do fabricante e registro dos produtos.
– Hoje já podemos abrir processos administrativos sancionadores com base na nota técnica. Mas buscamos uma solução – explica Timm.
Segundo Guilherme Santos, diretor jurídico da ABComm, o ambiente de vendas on-line ainda tem lacunas legislativas, sobretudo em relação às operações de marketplace. Estabelecer “regras claras quanto aos direitos e deveres dos envolvidos nessas relações tende a trazer segurança jurídica a todas as pontas”, afirma em nota.
Informe-se:
Antes de comprar, verifique todas as informações relativas ao revendedor, como CNPJ, telefone e site. O ideal é ligar e checar se a empresa existe. É possível consultar o CNPJ no site da Receita Federal.
Antes de comprar, não deixe de verificar os comentários de outros consumidores. E pergunte se há nota fiscal.
Selo e novas regras:
As empresas terão de informar os dados das companhias e os produtos que são comercializados dentro da sua plataforma de marketplace. As companhias que cumprirem todas as regras receberão um selo, para serem identificadas pelo consumidor.
Lista de foras da lei:
Será usada tecnologia para bloquear a venda de produtos falsificados. Haverá uma lista de revendedores que infringiram as condições das plataformas. A ideia é bloquear as companhias irregulares, para que não consigam vender em nenhum site brasileiro.
Fonte: Epoca Negócios