Epicentro da crise de saúde e econômica, América Latina e Caribe enfrentam forte perda de renda por causa da pandemia, mas o impacto da covid-19 não é igual para todas as camadas da população. Segundo levantamento da Ofxam, a fortuna de 73 bilionários das duas regiões aumentou US$ 48,2 bilhões entre março e meados de julho – uma alta de 17%. No seleto grupo de mais ricos, 42 estão no Brasil. De acordo com a ONG, o patrimônio dos bilionários brasileiros cresceu US$ 34 bilhões no período, para US$ 157,1 bilhões.
Os números fazem parte de relatório divulgado hoje. Para calculá-los, a Oxfam se baseou em dados da Forbes, que publica a lista anual de bilionários e possui um ranking que acompanha as fortunas em tempo real. Os ganhos dos latino-americanos mais abastados em meio à pandemia foram estimados comparando-se sua riqueza líquida entre 18 de março e 12 de julho.
Os US$ 48,2 bilhões a mais registrados no período representam mais de um terço (38%) do total dos pacotes de estímulo de todos os países da América Latina e do Caribe, destaca a Oxfam. O montante equivale, ainda, a nove vezes os empréstimos de urgência do Fundo Monetário Internacional (FMI) à região até o momento, segundo a ONG.
Desde o começo das medidas de quarentena para conter o avanço da covid-19, oito novos bilionários surgiram na região – ou seja, um novo bilionário a cada duas semanas, destaca a Oxfam. Em contraste, afirma a entidade, estima-se que até 52 milhões de pessoas na América latina e Caribe passarão a ser pobres com a crise, e 40 milhões devem perder seus empregos.
Em um primeiro momento, diz o relatório, o portfólio de ativos financeiros da elite foi afetado pela trajetória negativa das bolsas mundiais, que sofreram em 12 de março a maior queda de sua história. Em poucos dias, o contágio atingiu os mercados latino-americanos, que recuaram entre 10 e 15%, observa a Oxfam.
“No entanto, suas fortunas são um antídoto que lhes permite contar com uma capacidade de reação para rapidamente recolocar seus investimentos em ativos mais seguros ou rentáveis, assim como aproveitar as oportunidades do mercado”, diz a entidade.
“Enquanto a maioria da população se arrisca a ser contaminada para não perder emprego ou para comprar o alimento da sua família no dia seguinte, os bilionários não têm com o que se preocupar. Eles estão em outro mundo, o dos privilégios e das fortunas que seguem crescendo”, diz Katia Maia, diretora-executiva da Oxfam Brasil.
Em boxe do relatório, a ONG ressalta que a situação por aqui já era preocupante antes da pandemia, que deve agravar o quadro. “A trajetória do vírus é uma fotografia das profundas desigualdades do país”. Na vice-liderança mundial de número de casos e mortes, o Brasil tinha 40 milhões de trabalhadores informais e 12 milhões de desempregados antes da doença chegar ao país. Com o aumento da taxa de desemprego, que pode dobrar, os mais pobres serão os mais afetados, diz a Ofxam.
No documento, a entidade afirma que o Brasil precisa de uma reforma tributária que tenha como prioridade a redução das desigualdades, mas avalia que as discussões no Congresso sobre o tema têm focado apenas na simplificação da tributação sobre o consumo.
Para fazer frente aos impactos sociais e econômicos da pandemia na região, a ONG propõe uma série de medidas. A principal é a criação de um imposto sobre grandes fortunas. Outras sugestões são cobrar, de forma temporária, um imposto sobre resultados extraordinários de grandes empresas, taxar empresas digitais e reduzir tributos que pesam mais para pessoas de baixa renda, como os que incidem sobre os produtos da cesta básica e de uso sanitário.
Fonte: Valor